sábado, 26 de novembro de 2011

Liberdade de Expressão X Responsabilidade

Eu estava de férias, com minha farda de cabo Fuzileiro Naval guardada no armário. E, ainda em plena ditadura, fui convidado para militar no PMDB. Aceitei, não por ideologia política, por simpatia ao partido ou ao candidato Tancredo Neves. Aceitei para ocupar o tempo e faturar um extra que, diga-se de passagem, era bastante vantajoso. Minha função era abastecer os comitês do Rio de Janeiro e da Região Metropolitana, levando material dentro de uma Brasília paramentada para a campanha eleitoral. Chegava ao prédio da Avenida Rio Branco 100, ali onde se encontram as ruas do Ouvidor e Miguel Couto, em torno das 13h. Em um andar, lá no alto, funcionava o comitê Aureliano Chaves, base de Moreira Franco e de outros políticos cariocas e fluminenses, o meu local de trabalho.

Essa situação, tecnicamente, era inconcebível. Primeiro porque, na época, eu sequer tinha direito a voto em qualquer eleição, condição imposta a cabos e soldados das forças armadas, e atividade política não era permitida aos militares. Segundo porque eu não era habilitado para dirigir. Enquanto a falta de habilitação era somente uma contravenção penal, a atividade política era crime.

Convencional eu nunca fui. Mas hoje, confesso, penso que exagerei em alguns momentos da minha vida. O risco que corri em uma determinada tarde daquele verão de 1985 foi tremendo. Lá estávamos eu e o amigo que me convidou para essa empreitada distribuindo jornais de campanha na entrada do prédio da Central do Brasil. De repente, um grupo numeroso de colegas de farda chega para pegar o trem. E eu ali, no meio de todos, escondendo o rosto entre as páginas de um exemplar do jornal do PMDB. Se fosse reconhecido e denunciado, certamente seria investigado pelo pessoal da Inteligência (S2). Não haveria escapatória.

Durante alguns anos eu fui parte e vítima da ditadura. Por sorte, pra mim, a democracia não demorou a encontrar o país. Mas muitos dos que conheci na caserna viveram, se não todo, quase todo o regime militar. Durante a década de 1970 eu era apenas uma criança. E crianças gostam de brincar, não se importando com política, economia, relações sociais, “essas chatices”.

Vivemos hoje em um paraíso. Com crime organizado, com desvios de verbas públicas praticados por políticos, com alta taxa de juros, mas ainda assim vivemos em um paraíso. Não o paraíso ideal, mas o relativamente ideal. E assim, sem saber muito bem o que quer dizer CENSURA, muitos exigem e praticam a sua LIBERDADE DE EXPRESSÃO. São diversos os blogs e inúmeros os assuntos por eles tratados. As redes sociais abreviam o caminho das idéias entre o homem que pensa e torna público seus pensamentos e aqueles que, por um motivo ou por outro, se interessam por eles.

Esse cenário de liberdade, de revoluções, de integração total e quase imediata de culturas, muitas das vezes distantes milhares de quilômetros umas das outras, é permeado por muitos irresponsáveis. Quando são pessoas sem expressão, tudo bem. Porque o universo dessas pessoas é muito pequeno e as consequências ou são pequenas também ou são nenhuma. Agora, quando são pessoas públicas, mesmo as de pouca influência, ainda assim o resultado pode ser bem danoso. Dessa forma, não concordo nem discordo, de imediato, com nenhuma ideia nova promovida por políticos, artistas, jornalistas, profissionais renomados etc. Procuro sempre analisar, com cautela, o seu ponto de vista, mesmo ante sinceridade evidente.

A responsabilidade vai além do que se diz. Nem tudo pode ou precisa ser dito. E quando a necessidade de expressão é irrefutável, ainda assim é necessário dominar a sua forma. A liberdade de expressão passa, obrigatoriamente, antes, pelo crivo da responsabilidade. Fora isso, é promoção anárquica.

Por isso, antes de proferir a palavra, feche a boca mais uma vez.